Publicado por: Mariana Felippe, em: 2008-11-03 20:15:47
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Após 100 horas de seqüestro, aconteceu o inesperado. A polícia acreditava na rendição do jovem Limdemberg Alves, de 22 anos. Trabalhador e sem antecedentes criminais, ele estava em claro surto psicológico e mantinha refém há quatro dias a ex-namorada Eloá Cristina Pimentel, de 15 anos, e sua amiga Nayara Silva, da mesma idade. Inconformado com o fim do relacionamento de 3 anos, ele invadiu o apartamento em que morava Eloá e, na sexta-feira, acabou atirando nas duas meninas. Nayara ficou ferida no rosto e perdeu um dente. Eloá perdeu a vida.
Durante todo o tempo em que as garotas foram mantidas em cárcere privado, a polícia agiu do lado de fora do prédio, negociando a libertação, fornecendo alimentos, cumprindo exigências, confortando os familiares, e impedindo curiosos de se aproximar do local. Os comandantes da operação não contavam com o fim trágico da situação. E não contavam também com uma inimiga, que prejudicou o trabalho policial.
A mídia passou dos limites. Alguns veículos extrapolaram sua função de relator dos fatos e quiseram também virar personagens, agentes da história. O seqüestro virou objeto de comentários, especulações, “chutes” e, de repente, Lindemberg foi parar na televisão, conversando com jornalistas. Dois programas de tevê deram voz ao jovem descontrolado, que, nitidamente, precisava de tratamento e não de audiência. O jornalismo provou, mais uma vez, que pode também ser um desserviço.
A interferência midiática atrapalhou as negociações, pois inflou o ego do rapaz ao colocá-lo em rede nacional. Os jornalistas faziam ainda perguntas e colocações que iam contra o plano da polícia, que lutava para convencer o jovem a soltar as meninas. Um dos comandantes da negociação ligou e pediu que a imprensa não entrasse mais em contato com o rapaz. Por isso, uma das apresentadoras que conversou com Lindemberg, por telefone, ao vivo, reclamou que sua liberdade de expressão estava sendo cerceada. Liberdade de expressão cerceada? E o direito das duas meninas de sair com vida?
Os erros vieram de vários lados. A devolução de Nayara ao cativeiro, ainda sem justificativa convincente, a invasão tardia (ou não) do Grupo de Ações Táticas Especiais (Gate), as muitas concessões feitas ao seqüestrador. Os meios de comunicação têm apontado todas estas falhas e agem certo, pois é papel dos jornalistas informar a sociedade. Mas analisar tudo isso é, agora, incumbência da justiça. Os jornalistas devem assumir outra obrigação, a de analisar o que fazem seus pares e lutar para que episódios vexatórios como esse não aconteçam, afinal, o jornalismo existe, em primeiro lugar, para servir aos cidadãos.
AUDIÊNCIA PÚBLICA: No próximo dia 11, às 14 horas, a Câmara dos Deputados discutirá a cobertura da mídia sobre o caso em audiência pública, conforme proposto pelo deputado Ivan Valente (PSOL-SP).
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