É provável que entre os pioneiros do nosso cinema o mineiro Humberto Mauro (1897-1983) seja o mais investigado, ao menos desde que Paulo Emilio Salles Gomes se dedicou a ele nos anos 1970. Nos estudos alentados figura o livro da pesquisadora Sheila Schvarzman, Humberto Mauro e as Imagens do Brasil, relato completo de sua produção, e as publicações de Jorge Antonio Rangel e Ronaldo Werneck. O esgotamento do tema e do personagem parece distante, como nos prova o livro Humberto Mauro, Cinema, História, do professor da USP Eduardo Morettin, agora lançado. Sua perspectiva parte do realizador renomado de Brasa Dormida e Ganga Bruta que nos anos 1930 aceita a incumbência do governo Vargas de realizar filmes de caráter histórico.
Dessa produção no âmbito do Instituto Nacional de Cinema Educativo, o Ince, Morettin atenta a dois filmes em particular, o curta O Descobrimento do Brasil (1937) e o média-metragemOs Bandeirantes (1940). Tais projetos demonstram “tentativas do Estado de controlar e padronizar a produção cultural”. Não apenas a peculiaridade de um realizador de ficção se vincular à iniciativa educacional chama a atenção aqui, mas o fato de que, nas produções, Mauro se articule a nomes e a outras áreas artísticas, como a música e a pintura, numa decisão inédita.
A colaboração intelectual incluía, por exemplo, os escritores Edgar Roquette-Pinto, diretor do Ince, e Affonso de Taunay, então responsável pelo Museu Paulista, mais conhecido como Ipiranga. O acervo da instituição, com telas como A Primeira Missa, de Victor Meirelles, inspiraria Mauro para a realização de O Descobrimento do Brasil, que ainda incluiu uma trilha sonora encomendada a Villa-Lobos. Morettin discute o contexto em que se desenvolvem os filmes, como o ideal da marcha de progresso para o Centro-Oeste do País, veiculado por Os Bandeirantes, ao final obras de resultados frustrados pela “melancolia” inerente ao cinema de Mauro.
*Carta Capital
Humberto Mauro, Cinema, História
Alameda Editorial,
494 págs., R$ 94