‘Se privatizassem 98% da água estaríamos nas ruas, por uma revolução. E quando fazem isso no espectro?’ A provocação lançada pelo ativista da Rhizomatica no México, Peter Bloom, durante o primeiro debate no Seminário Internacional Espectro e Redes Livres trouxe à tona o perigo da privatização de um bem comum pouquíssimo debatido no Brasil.
A discussão da mesa ‘práticas e propostas do uso do espectro pela sociedade civil’ trouxe experiências latino-americanas e europeias do uso das frequências de rádios comunitárias, livres e telefonias comunitárias. Além disso, o encontro propiciou também uma clareza sobre a importância de se compreender o espectro eletromagnético como um direito fundamental.
No entanto, a imaterialidade deste bem comum o torna, muitas vezes, esquecido até mesmo por movimentos que defendem a democratização da mídia. A necessidade de mudar este pensamento é essencial. Durante a mesa, Peter Bloom contou a iniciativa do coletivo Rhizomatica que implantou o serviço de telefonia comunitária em 16 comunidades no interior do México. A experiência é pioneira em todo o mundo e mostra como é possível a autonomia, independência e sustentabilidade até mesmo no setor das telecomunicações.
De acordo com o ativista, foi necessário combater afirmações falsas que eram defendidas pela legislação do próprio México, como a de que o espectro forma parte do espaço aéreo. Para o ativista, a comunicação é vital e está diretamente ligada ao território e a cultura e, partindo do princípio de que o espectro é socialmente construído, é essencial que não apenas empresas privadas usufruam deste espaço, mas também a população geral.
Já Francesco Diosi, secretário internacional da Associação Mundial de Rádios Comunitárias (Amarc) foi mais incisivo quanto a necessidade de regularizar o espectro para evitar que seja um espaço de ‘colonizado’. Para ele, a migração para o digital nada mais é do que uma forma das grandes empresas dominarem este território restringindo cada vez mais o direito de acesso à sociedade civil organizada .
O encontro teve ainda a presença dos pesquisadores Francisco Caminati, da Unesp e Diego Vicentin, da Unicamp, que apresentaram, respectivamente, análises sobre a liberdade vigiada da internet e a convergência da rede móvel e wifi.
A presença de TC Silva, da Rede Mocambos, rompeu com academicismo e trouxe para o Seminário questionamentos importantes do ponto de vista do movimento negro e das raízes culturais brasileiras. Ele falou a respeito do tambor como um meio de comunicação ‘offline’ ancestral que até hoje pode ser utilizado e sobre o servidor de troca de experiências Baobáxia. O ativista deixou um recado para o público e palestrantes: ‘temos que valorizar a rota do escambo para fazer um mundo mais do nosso jeito que nos reconecte com nós mesmos , esse é o principal dos espetros: o humano’
As atividades do Seminário vão até esta sexta-feira (1). Para saber toda a programação do Seminário Internacional Espectro e Redes Digitais, clique aqui. (pulsar)