A Psicologia Social Tradicional
É a área da Psicologia que procura estudar a interação social. É o estudo das manifestações do comportamento através da interação de uma pessoa com outras, ou pela mera expectativa de tal interação.
Entendemos por interação social a interdependência entre os indivíduos que, juntamente com o encontro social, são os objetos investigados pela psicologia social. Dentro dessa perspectiva, os principais conceitos são: a percepção social, a comunicação, as atitudes, a mudança de atitudes, o processo de socialização, os grupos sociais e os papéis sociais.
Percepção social
O encontro com o outro é o primeiro processo de percepção social. Percebemos não só a presença do outro, mas o conjunto de características que apresenta; o que nos possibilita ter uma impressão dele.
Essa impressão é possível porque, a partir de nossos contatos com o mundo, vamos organizando estas informações em nossa cognição (organização do conhecimento no nível da consciência), e é esta organização que nos permitirá compreender ou categorizar um novo fato.
Comunicação
Processo que envolve codificação (formação de um sistema de códigos) e decodificação (a forma de procurar entender a codificação) de mensagens. Essas mensagens permitem a troca de informações entre os indivíduos.
A comunicação não é constituída apenas de código verbal. Também utilizamos para a comunicação expressões faciais, gestos, movimentos, desenhos e sinais.
A partir deste esquema básico de comunicação: transmissor (aquele que codifica), mensagem (transmitida utilizando um código), receptor (aquele que decodifica), a psicologia social estudou o processo de interdependência e da influência entre as pessoas que se comunicam, respondendo a questões do tipo: como se dá a influência? Quais as características da mensagem? Como aumentar nosso poder de persuasão através da comunicação? Quais os processos psicológicos envolvidos na comunicação?
Atitudes
A partir da percepção do meio social e dos outros, o indivíduo vai organizando estas informações, relacionando-as com afetos (positivos ou negativos) e desenvolvendo uma predisposição para agir (favorável ou desfavoravelmente) em relação às pessoas e aos objetos presentes no meio social. A essas informações com forte carga afetiva, que predispõem o indivíduo para uma determinada ação (comportamento), damos o nome de atitudes.
Portanto, para a psicologia social, diferentemente do senso comum, nós não tomamos atitudes (comportamento, ação), nós desenvolvemos atitudes (crenças, valores, opiniões) em relação aos objetos do meio social.
As atitudes possibilitam-nos certa regularidade na relação com o meio. Temos atitudes positivas em relação a determinados objetos ou pessoas, e isto nos predispõe a uma ação favorável em relação a eles. Isto porque os componentes da atitude (informações, afeto e predisposição para a ação) tendem a ser congruentes (coerentes). Sendo assim, as atitudes são bons preditores de comportamentos.
Mudança de atitudes
Nossas atitudes podem ser modificadas a partir de novas informações, novos afetos ou novos comportamentos ou situações. Podemos mudar nossa atitude em relação a um determinado objeto porque descobrimos que ele faz bem à saúde ou nos ajuda de alguma forma. Por Ex: você não gostou da capa de um livro, mas como foi obrigado a comprá-lo e a ler. A obra mudou sua atitude (em relação à má impressão da capa), pois gostou do seu conteúdo.
Existe uma forte tendência a manter os componentes das atitudesem consonância. Informaçõespositivas levarão ao afeto positivo, um comportamento favorável na direção do objeto.
Processo de socialização
A formação do conjunto de nossas crenças, valores e significações dão-se no processo que a psicologia social denominou socialização. Nesse processo, o indivíduo torna-se membro de um determinado conjunto social, aprendendo seus códigos, suas normas e regras básicas de relacionamento, apropriando-se do conjunto de conhecimentos já sistematizados e acumulados por um determinado conjunto social.
A socialização é o processo de internalização (apropriação) do mundo social, com suas normas, valores, modos de representar os objetos e situações que compõem a realidade objetiva. É o processo de constituição de uma realidade subjetiva, que se forma a partir das primeiras relações do indivíduo com o meio social.
Grupos sociais
O grupo social supõe um conjunto de pessoas num processo de relação mútua e organizado com a finalidade de atingir um objetivo imediato ou mais em longo prazo. O objetivo imediato pode ser, por exemplo, fazer um trabalho para a faculdade e, mais em longo prazo, editar um jornal mural na sala de aula.
A consecução do objetivo impõe tarefas, regras que regulem as relações entre as pessoas (normas), um processo de comunicação entre todos os participantes do grupo e o próprio desenvolvimento do grupo em direção ao seu objetivo.
Existem organizações ou elementos que servem de intermediários entre o conjunto social mais amplo e o indivíduo. Essa intermediação é feita pelos grupos sociais (família, amigos, religião, raça...). Representam nosso pertencimento ou referência, nos aponta como devemos nos comportar, o que dizer; como perceber o outro; do que gostar ou não gostar.
Os grupos sociais são pequenas organizações de indivíduos que, possuindo objetivos comuns, desenvolvem ações na direção desses objetivos. Para garantir essa organização, possuem normas; formas de pressionar seus elementos para que se conformem às normas; um funcionamento determinado, com tarefas e funções distribuídas entre seus integrantes; formas de cooperação e de competição; seu líder apresenta aspectos que atraem os indivíduos, impedindo que abandonem o grupo.
A psicologia social dedicou grande parte de seus estudos à compreensão desses processos grupais.
Papéis sociais
Entendida a sociedade como um conjunto de posições sociais (médico, professor, estudante, filho, pais...), todas as expectativas de comportamento estabelecidas pelo conjunto social para os ocupantes das diferentes posições sociais determinam o chamado papel prescrito. Assim, sabemos o que esperar de alguém que ocupa uma determinada posição.
Todos os comportamentos que manifestamos na nossa vida são chamados, na psicologia social, de papel desempenhado. Tais comportamentos, por sua vez, podem ou não estar de acordo com a prescrição social, isto é, as normas prescritas socialmente para o desempenho de um determinado papel.
Os papéis sociais permitem-nos compreender a situação social, pois são referências para a nossa percepção do outro, ao mesmo tempo em que são referências para o nosso próprio comportamento. Quando aprendemos um papel social, aprendemos também o papel complementar, ou seja, o aluno aprende, desde o início da vida escolar, o papel do professor.
Os diferentes papéis sociais e a nossa enorme capacidade de adaptação as situações sociais nos possibilitam comportar diferentemente em cada uma delas. Aprender os nossos papéis sociais é, na realidade, aprender o conjunto de rituais que nossa sociedade criou.
Cada momento de comunicação e interação entre seres humanos são sempre momentos do nosso processo de socialização, que é ininterrupto no decorrer de nossas vidas.
Críticas à Psicologia Social Tradicional
A teoria da psicologia social tem recebido, atualmente, inúmeras críticas, entre elas:
* É uma corrente baseada em um método descritivo, isto é, um método que se propõe a descrever aquilo que é observável, factual. É uma psicologia que organiza e dá nome aos processos observáveis dos encontros sociais.
* É uma teoria que tem seu desenvolvimento comprometido com os objetivos da sociedade norte-americana do pós-guerra, que precisava de conhecimentos e de instrumentos que possibilitassem a intervenção na realidade, de forma a obter resultados imediatos, com a intenção de recuperar uma nação, garantindo o aumento da produtividade econômica. Não é para menos que os temas mais desenvolvidos foram a comunicação persuasiva, a mudança de atitudes e a dinâmica grupal, voltados sempre para a procura de “fórmulas de ajustamento e adequação de comportamentos individuais ao contexto social” (1)
Busca compreender como se dá a construção do psiquismo humano (o mundo interno) a partir das relações sociais vividas pelo homem. O mundo objetivo passa a ser visto não como fator de influência para o desenvolvimento da subjetividade, mas como fator constitutivo. O comportamento deixa de ser o objeto de estudo para ser uma das expressões do mundo psíquico e fonte de dados para a compreensão da subjetividade. Essa nova psicologia social pretende ir além do que é observável, isto é, além do comportamento, buscando compreender o mundo invisível do indivíduo.
O homem como ser social, como um ser de relações sociais, está em permanente movimento. Estamos sempre nos transformando, apesar de aparentemente nos mantermos iguais. Isso porque nosso mundo interno se alimenta dos conteúdos que vêm do mundo externo e, como nossa relação com esse mundo exterior não cessa, estamos sempre em movimento, em processo de transformação, transformando a ação.
A nova psicologia social irá propor, como conceitos básicos de análise a atividade, a consciência e a identidade, que são as propriedades ou características essenciais dos homens e expressam o movimento humano.
Atividade
É através dela que o homem se aproxima do mundo. É a atividade que propicia a transição daquilo que está fora do homem para dentro dele. Ex: a criança que se apropria do mundo, manuseando os objetos, desmontando-os, montando-os, colocando-os para dentro de si, transformando a experiência em imagens e em idéias que passam a habitar o seu mundo interno.
A atividade (prática humana) é a base do conhecimento e do pensamento do homem. É a necessidade que os indivíduos apresentam na manutenção de uma relação ativa com o mundo externo. Para existirmos, precisamos atuar sobre o mundo, transformando-o de acordo com nossas necessidades. Ao fazer isso, estamos construindo a nós mesmos. A existência do mundo interno, depende do mundo externo. Atuar no mundo é uma propriedade do homem e a atividade é uma das suas determinações.
Consciência
Expressa a forma como o homem se relaciona com o mundo objetivo. O homem reage ao mundo compreendendo-o. A consciência não se limita apenas ao saber lógico, ela inclui o saber das emoções e sentimentos do ser humano, o saber dos desejos, o saber do inconsciente.
Como maneira de reagir ao mundo, a consciência está em permanente movimento. Ela é produto das relações sociais que os homens estabelecem. O cérebro humano foi se aperfeiçoando através dos séculos, mas essa evolução não teria lugar se não houvesse condições externas ao homem que o estimulassem, como por Ex: o trabalho, a vida social e a linguagem.
O homem encontra um mundo de objetos e significados já construídos pelos seus pares. Nas relações sociais, ele se apropria desse mundo cultural e desenvolve o sentido pessoal. Produz assim, uma compreensão sobre o mundo, sobre si mesmo e os outros, construída no processo de produção da existência, tendo sua matéria-prima na realidade objetiva e social, mas que é própria do indivíduo, pois é o resultado de um trabalho seu.
Estuda-se a consciência através de suas mediações. No mundo observável, vamos encontrar as representações sociais, veiculadas pela linguagem, que são expressões da consciência. Quando alguém discursa ou simplesmente fala sobre algum assunto, está se referindo ao mundo real e expressa sua consciência através das representações sociais, denominação dada ao conjunto de idéias que articulam os significados sociais, ou seja, o sentido construído coletivamente para o objeto, com sentido pessoal. Envolve crenças, valores e imagens que os indivíduos constroem, no decorrer de suas vidas, a partir da vivência na sociedade.
Identidade
É a denominação dada às representações e sentimentos que o indivíduo desenvolve a respeito de si, a partir do conjunto de suas experiências. Ela é a síntese pessoal sobre o si mesmo, incluindo dados pessoais (cor, sexo, idade...), biografia (trajetória pessoal), atributos que os outros lhe conferem, permitindo uma representação a respeito de si.
Este conceito supera a compreensão do homem enquanto conjunto de papéis, de valores, de habilidades, atitudes..., pois compreende todos estes aspectos integrados (o homem como totalidade) e busca captar a singularidade do indivíduo, produzida no confronto com o outro.
A mudança nas situações sociais, na história de vida e nas relações sociais, determina um processar contínuo na definição de si mesmo. Neste sentido, a identidade do indivíduo deixa de ser algo estático e acabado, para ser um processo contínuo de representações de seu estar sendo no mundo.
Concluindo
A psicologia social tradicional é descritiva, enquanto a nova proposta busca ser explicativa ou compreensiva, enfocando a relação que o indivíduo mantém com a sociedade e os processos subjetivos que vão ocorrendo nessa relação.
Para a psicologia social tradicional o homem é um ser que reage às estimulações externas, atribui-lhes significado e se comporta no espaço social. A nova psicologia social concebe o homem como um ser de natureza social, que constrói a si próprio, ao mesmo tempo em que constrói, com outros homens, a sociedade e sua história. A nova corrente desvincula-se da tradição americana de ciência pragmática, com intenções de prever o comportamento e manipulá-lo, optando por uma ciência que, ao melhorar a compreensão que se tem da realidade social e humana, permita ao homem transformá-la.
A psicologia do desenvolvimento
O governo mais difícil é o governo de si mesmo.
Sêneca
Área que estuda o desenvolvimento do ser humano em todos os seus aspectos: físico-motor, intelectual, afetivo-emocional e social - desde o nascimento até a idade adulta, isto é, a idade em que todos estes aspectos atingem o seu mais completo grau de maturidade e estabilidade.
Existem várias teorias do desenvolvimento humanoem Psicologia. Elasforam construídas a partir de observações, pesquisas com grupos de indivíduos em diferentes faixas etárias ou em diferentes culturas, estudos de casos clínicos, acompanhamento de indivíduos desde o nascimento até a idade adulta. Dentre essas teorias, destaca-se a de Jean Piaget (1896-1980), psicólogo e biólogo suíço, pela sua vasta produção de pesquisas, pelo rigor científico de sua produção teórica e pelas implicações práticas de sua teoria, principalmente no campo da Educação.
O desenvolvimento humano
Refere-se ao desenvolvimento mental e ao crescimento orgânico. O desenvolvimento mental é uma construção contínua, que se caracteriza pelo aparecimento gradativo de estruturas mentais. Estas são formas de organização da atividade mental que se vão aperfeiçoando e se solidificando até o momento em que todas elas, estando plenamente desenvolvidas, caracterizarão um estado de equilíbrio superior quanto aos aspectos da inteligência, vida afetiva e relações sociais.
Algumas dessas estruturas mentais permanecem ao longo de toda a vida. Por exemplo, a motivação está sempre presente como desencadeadora da ação, quer seja por necessidades fisiológicas, quer seja por necessidades afetivas ou intelectuais. Essas estruturas mentais que permanecem garantem a continuidade do desenvolvimento. Outras estruturas são substituídas a cada nova fase da vida do indivíduo. Por exemplo, a moral da obediência da criança pequena é substituída pela autonomia moral do adolescente ou, outro exemplo, a noção de que o objeto existe só quando a criança o vê (antes do 2 anos) é substituída posteriormente pela capacidade de atribuir ao objeto sua conservação, mesmo quando ele não está presente no seu campo visual.
Estudar o desenvolvimento humano significa conhecer as características comuns de uma faixa etária, permitindo-nos reconhecer as individualidades, o que nos torna mais aptos para a observação e interpretação dos comportamentos. Estudos e pesquisas de Piaget demonstraram que existem formas de perceber, compreender e se comportar diante do mundo, próprias de cada faixa etária, ou seja, existe uma assimilação progressiva do meio ambiente, que implica uma acomodação das estruturas mentais a este novo dado do mundo exterior.
Todos esses aspectos levantados têm importância para a Educação. Planejar o que e como ensinar implica saber quem é o educando. Exemplo: a linguagem que usamos com uma criança de 6 anos não é a mesma que empregamos com uma jovem de 12 anos.
Os fatores que influenciam o desenvolvimento humano
Estudar o desenvolvimento humano significa descobrir que ele é determinado pela interação de vários fatores. A saber:
Hereditariedade - a carga genética estabelece o potencial do indivíduo, que pode ou não desenvolver-se. Existem pesquisas que comprovam os aspectos genéticos da inteligência. No entanto, a inteligência pode desenvolver-se aquém ou além do seu potencial, dependendo das condições do meio que encontra.
Crescimento orgânico - refere-se ao aspecto físico. O aumento de altura e a estabilização do esqueleto permitem ao indivíduo comportamentos e um domínio do mundo que antes não existiam. Exemplo: as possibilidades de descobertas de uma criança, quando começa a engatinhar e depois a andar, em relação a quando esta criança estava no berço com alguns dias de vida.
Maturação neurofisiológica - é o que torna possível determinado padrão de comportamento. A alfabetização das crianças, por exemplo, depende dessa maturação. Para segurar o lápis e manejá-lo como nós, é necessário um desenvolvimento neurológico que a criança de 2 anos não tem. Observe como ela segura o lápis.
Meio - o conjunto de influências e estimulações ambientais altera os padrões de comportamento do indivíduo. Exemplo: se a estimulação verbal for muito intensa, uma criança de 3 anos pode ter um repertório verbal muito maior do que a média das crianças de sua idade., mas, ao mesmo tempo, pode não subir e descer com facilidade uma escada, porque esta situação pode não ter feito parte de sua experiência de vida.
Aspectos do desenvolvimento humano
O desenvolvimento humano deve ser entendido como uma globalidade, mas, para efeito de estudo, tem sido abordado a partir de quatros aspectos básico:
Aspecto físico-motor - refere-se ao crescimento orgânico, à maturação neurofisiológica, à capacidade de manipulação de objetos e de exercício do próprio corpo. Exemplo: a criança leva a chupeta à boca ou consegue tomar mamadeira sozinha, por volta dos 7 meses, porque já coordena os movimentos das mãos.
Aspecto intelectual - é a capacidade de pensamento, raciocínio. Exemplo: a criança de 2 anos que usa um cabo de vassoura para puxar um brinquedo que está embaixo de um móvel ou o jovem que planeja seus gastos a partir de seu salário.
Aspecto afetivo-emocional - é o modo particular de o indivíduo integrar as suas experiências. É o sentir. A sexualidade faz parte dessa etapa. Exemplo: a vergonha que sentimos em algumas situações, o medo em outras, a alegria de rever um parente querido.
Aspecto social - é a maneira como o indivíduo reage diante das situações que envolvem outras pessoas. Exemplo: em um grupo de crianças, no parque, é possível observar algumas que espontaneamente buscam outras para brincar, e algumas que permanecem sozinhas.
Todas as teorias do desenvolvimento humano partem do pressuposto de que esses quatro aspectos são indissociados, mas elas podem enfatizar aspectos diferentes, ou seja, estudar o desenvolvimento global a partir da ênfase em um dos aspectos. A Psicanálise, por exemplo, estuda o desenvolvimento da sexualidade. Jean Piaget enfatiza o desenvolvimento intelectual.
A teoria do desenvolvimento humano de Piaget
O psicólogo divide os períodos do desenvolvimento de acordo com o aparecimento de novas qualidades do pensamento, o que, por sua vez, interfere no desenvolvimento global.
10 período: sensório-motor (0 a 2 anos)
Neste período a criança conquista, através da percepção e dos movimentos, todo o universo que a cerca. Para o recém-nascido a vida mental está reduzida ao exercício dos aparelhos reflexos, de fundo hereditário, como a sucção, que melhoram com o treino. Exemplo: o bebê mama melhor no 15º dia do que no 4º dia de vida. Já próximo ao final do período a criança descobre que é capaz de usar um instrumento como meio de atingir um objeto. Por exemplo: se puxar a toalha da mesa a lata de biscoitos ficará mais perto. Utiliza a inteligência prática ou sensório-motora que envolve as percepções e movimentos.
No curto espaço de tempo desse período a criança evolui de uma atitude passiva em relação ao ambiente e pessoas de seu mundo para uma atitude ativa e participativa. Sua integração no social se dá pela imitação das regras. Embora compreenda algumas palavras, só é capaz de uma fala imitativa.
20 período: pré-operatório (2 a 7 anos)
Neste período surge a linguagem que irá proporcionar mudanças significativas nos aspectos afetivo, intelectual e social da criança. É o início da interação e comunicação. Com a palavra falada e escrita surge a possibilidade da exteriorização da vida interior, antecipando o que o ser irá fazer. É o momento de desenvolver o pensamento. No início desse período a criança transforma o real em função dos seus desejos e fantasias (fase dos jogos simbólicos) e posteriormente utiliza-o como referencial para explicar o mundo real, ou seja, a sua própria atividade, seu eu e suas leis morais. No final do período passa a procurar a causa e finalidade de tudo; é o momento dos famosos porquês, um pensamento mais adaptado ao outro e ao real.
Importante destacar que neste período a maturação neurofisiológica se completa, permitindo o desenvolvimento de novas habilidades, como a coordenação motora fina - pegar pequenos objetos com a ponta dos dedos, saber segurar o garfo ou o lápis corretamente.
30 período: operações concretas (7 a 11 ou 12 anos)
É o início da construção lógica, ou seja, a capacidade da criança estabelecer relações que permitam a coordenação de pontos de vista diferentes. No plano afetivo isto significa que ela será capaz de cooperar com os outros, de desenvolver tarefas em grupo e ao mesmo tempo ter autonomia. É capaz de entender conceitos como liberdade e justiça. Vai aprendendo a dominar progressivamente a capacidade de abstrair e generalizar.
No aspecto afetivo surge o aparecimento da vontade como qualidade superior. A criança adquire uma crescente autonomia em relação ao adulto, passando a organizar os seus próprios valores morais. Exemplo: o respeito mútuo, a honestidade, o companheirismo, a justiça, que considera a intenção na ação. O grupo de colegas satisfaz as necessidades de segurança e afeto.
40 período: operações formais (11 ou 12 anos em diante)
É a chegada da adolescência, quando ocorre a passagem do pensamento concreto para o formal (abstrato), proporcionando a realização de operações no plano das idéias, sem necessitar de manipulação ou referências concretas, como no período anterior. Cria teorias sobre o mundo, principalmente sobre aspectos que gostaria de reformular.
No aspecto afetivo o adolescente vive muitos conflitos. Deseja se libertar dos adultos, mas ainda depende deles. Deseja ser aceito pelos amigos e pessoas mais velhas. Sua referencial maior passa a ser o grupo de amigos, determinando seu comportamento (maneira de vestir, falar, pensar...). São diversos os interesses, gerando mudanças constantes no fazer e pensar. A estabilidade chega com a proximidade da idade adulta.
Segundo Piaget, cada período é caracterizado por aquilo que de melhor o indivíduo consegue fazer nessas faixas etárias. Todos os indivíduos passam por todas essas fases ou períodos, nessa seqüência, porém o início e o término de cada uma delas dependem das características biológicas do indivíduo e de fatores educacionais, sociais. Portanto, a divisão nessas faixas etárias é uma referência, e não uma norma rígida.
Na idade adulta não surge nenhuma nova estrutura mental, e o indivíduo caminha então para um aumento gradual do desenvolvimento cognitivo, em profundidade, e uma maior compreensão dos problemas e das realidades significativas que o atingem. Isto influencia os conteúdos afetivos-emocionais e sua forma de estar no mundo.
O enfoque interacionista do desenvolvimento humano por Vigotski
Ao falarmos de desenvolvimento humano não podemos deixar de citar o autor Lev Semenovich Vigotski, que nasceu na Bielo-Rus, no ano de 1896, falecendo prematuramente aos 37 anos de idade. Vigotski foi um dos teóricos que buscou uma alternativa dentro do materialismo dialético para o conflito entre as concepções idealista e mecanicista na Psicologia. Ao lado de Luria e Leontiev, construiu propostas teóricas inovadoras sobre temas como: relação pensamento e linguagem, natureza do processo de desenvolvimento da criança e o papel da instrução no desenvolvimento.
Vigotski foi ignorado no Ocidente, e mesmo na ex-União Soviética a publicação de suas obras foi suspensa entre 1936 e 56. Atualmente seu trabalho vem sendo estudado e valorizado no mundo inteiro.
Um pressuposto básico da obra de Vigotski é que as origens das formas superiores de comportamento consciente (pensamento, memória, atenção voluntária...), formas essas que diferenciam o homem dos outros animais, devem ser achadas nas relações sociais que o homem mantém. Mas Vigotski não via o homem como um ser passivo, conseqüência dessas relações. Entendia o homem como ser ativo, que age sobre o mundo, sempre em relações sociais, e transforma essas ações para que constituam o funcionamento de um plano interno.
Para Vigotski, as funções psicológicas emergem e se consolidam no plano da ação entre pessoas e tornam-se internalizadas, ou seja, transformam-se para constituir o funcionamento interno. O plano interno não é a reprodução do plano externo, pois ocorrem transformações ao longo do processo de internalização. Do plano interpsíquico, as ações passam para o plano intrapsíquico. Considera, portanto, as relações sociais como constitutivas das funções psicológicas do homem. Essa visão de Vigotski justificou o título de sócio-interacionismo à sua teoria.
Vigotski deu ênfase, como mecanismo que intervém no desenvolvimento das funções psicológicas complexas, ao processo de internalização. Esta é reconstrução interna de uma operação externa e tem como base a linguagem. O plano interno, para Vigotski, não preexiste, mas é constituído pelo processo de internalização, fundado nas ações, nas interações sociais e na linguagem.
Assim, para Vigotski, a história da sociedade e o desenvolvimento do homem caminham juntos e, mais do que isso, estão de tal forma intrincada, que um não seria o que é sem o outro. Com essa perspectiva, é que Vigotski estudou o desenvolvimento infantil. Para ele, as crianças, desde o nascimento, estão em constante interação com os adultos, que ativamente procuram incorporá-las a suas relações e a sua cultura.
O desenvolvimento infantil na visão do psicólogo russo é visto a partir de três aspectos: cultural, instrumental e histórico.
Aspecto cultural
Envolve os meios socialmente estruturados pelos quais a sociedade organiza os tipos de tarefa que a criança em crescimento enfrenta. Um dos instrumentos básicos criados pela humanidade é a linguagem, por isso Vigotski deu ênfase à linguagem e sua relação com o pensamento.
Aspecto instrumental
Refere-se à natureza mediadora das funções psicológicas complexas. Temos como exemplo a atitude popular de amarrar um barbante no dedo para lembrar algo. O estímulo (o laço) significa mais do que um dedo amarrado, adquirindo o sentido, por sua função mediadora, de lembrar o indivíduo de algo importante.
Aspecto histórico
Funde-se com o cultural, pois os instrumentos que o homem lança mão, para dominar o seu ambiente e seu comportamento, foram criados e modificados ao longo da história social da civilização. Os instrumentos culturais expandiram os poderes dos seres humanos e estruturaram seu pensamento, através da linguagem escrita e aritmética.
Para o psicólogo russo a história da sociedade e o desenvolvimento do homem caminham lado a lado. Foi com essa visão que Vigotski estudou o desenvolvimento infantil.
A diferença básica entre Piaget e Vigotski
Se compararmos os dois maiores teóricos do desenvolvimento humano, podemos dizer, correndo algum risco de sermos simplistas, que Piaget apresenta uma tendência hiperconstrutivista em sua teoria, com ênfase no papel estruturante do sujeito. Maturação, experiências físicas, transmissões sociais e culturais, são fatores desenvolvidos na teoria de Piaget. Vigotski, por outro lado, enfatiza o aspecto interacionista, pois considera que é no plano intersubjetivo, ou seja, na troca entre as pessoas, que têm origem as funções mentais superiores.
A teoria de Piaget apresenta também a dimensão interacionista, mas sua ênfase é colocada na interação do sujeito com o objeto físico. Além disso, não está clara em sua teoria a função da interação social no processo do conhecimento.
A teoria de Vigotski, por outro lado, também apresenta um aspecto construtivista, na medida em que busca explicar o aparecimento de inovações e mudanças no desenvolvimento a partir do mecanismo de internalização. No entanto, temos na teoria sócio-interacionista apenas um quadro esboçado, que apresenta sugestões e caminhos, mas necessita de estudos e pesquisas que explicitem os mecanismos característicos dos processos de desenvolvimento.
Luria aponta uma diferença entre essas teorias: “quando a obra de Piaget, A linguagem e o pensamento da criança, chegou ao nosso conhecimento, nós a estudamos cuidadosamente. Um desacordo fundamental da interpretação da relação entre a linguagem e o pensamento distinguia o nosso trabalho da obra desse grande psicólogo suíço... discordamos fundamentalmente da idéia de que a fala inicial da criança não apresenta um papel importante no pensamento.” (2)