As eleições trazem à pauta a redução da maioridade penal. O perigo desse discurso é tema de matéria do Observatório da Sociedade Civil, da Associação Brasileira de Organizações Não-Governamentais, a ABONG.
1 alt="entry-title">Sociedade civil contesta discurso a favor da redução da maioridade penal“Reduzir a maioridade penal é consagrar a violência como proposta do estado. O estado não pode ser vingativo, tem que ser educativo”. A afirmação é de Edmundo Kroger, membro do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda).
O tema voltou à pauta durante os debates eleitorais, trazido por candidatos como Aécio Neves (PSDB) e o derrotado Levy Fidelix (PRTB). O tucano, que disputa o segundo turno das eleições contra a presidenta Dilma Rousseff (PT), baseou-se na Proposta de Emenda Constitucional (PEC) apresentada há dois anos pelo vice de sua chapa, Aloysio Nunes. A PEC 33/2012 prevê a redução da maioridade penal em casos específicos. Em debate realizado pela TV Record, Aécio Neves defendeu a proposta, afirmando que seria importante para “reduzir a sensação de impunidade” no país. Dilma posicionou-se contra a medida.
Um levantamento feito pela Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp) do Ministério da Justiça com dados de 2011 apontou que menores de idade cometeriam menos de 1% de crimes no país. A estimativa era de que menores de 16 a 18 anos eram responsáveis por 0,9% do total de crimes e, se considerado apenas homicídios e tentativas de homicídio, o número caía para 0,5%.
Kroger ressalta que a premissa de que menores são autores da maior parte dos crimes no país é falsa e que na realidade a impunidade não está no adolescente e sim no adulto. Para ele, a redução da maioridade penal designa uma redução de direitos, “uma alteração dissimulada e às escondidas do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)”. Além disso, desrespeita o Artigo 227 da Constituição Federal, que determina, com absoluta prioridade, o direito à vida, à educação, à dignidade, à liberdade e outras garantias ao adolescente e ao jovem, “além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”.
A retomada do debate fez surgirem novos posicionamentos da sociedade civil organizada a favor da proteção dos direitos da criança e do adolescente, apontando para a deficiência ou ausência de políticas que contemplem a juventude. Por outro lado, são despertados também discursos punitivistas, que demandam tratamento igual àqueles que cometerem crimes, independente se adultos ou jovens, e apoiam a redução da maioridade penal.
Em manifesto divulgado este mês, entidades da sociedade civil pressionam os candidatos à presidência para que apresentem um compromisso com uma política socioeducativa aliada às conquistas alcançadas na Constituição de 1988.
Segundo o documento, o ECA “rompe com a cultura menorista presente nos Códigos 1927 e 1979”, assim como a Lei do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE) inaugura modificações importantes no âmbito das medidas socioeducativas. Sendo assim, ignorar essas conquistas seria um retrocesso social. “Não há, portanto, lei ou mecanismo subjacente à Constituição Federal que possa veicular decisões contrárias às conquistas históricas do povo brasileiro, sendo toda e qualquer medida anunciada flagrantemente inconstitucional”.
O SINASE, criado em 2006, estabelece parâmetros de atendimento ao adolescente, com atenção à educação, saúde e profissionalização. No entanto, o Projeto de Lei de Execução de Medidas Socioeducativas, que regulamenta as funções do SINASE, ainda espera para ser votado no Congresso. Enquanto isso, adolescentes que cometem crimes são submetidos a medidas de punição permitidas pela falta de estrutura e de preparo de agentes educativos. Segundo Kroger, a Fundação Casa, que deveria ser uma instituição socioeducativa, ainda é um sistema punitivo.
No caso do Conanda, há propostas de limitar em até 20 o número de jovens por unidade, sendo que hoje algumas abrigam cerca de 400. O uso excessivo da medida de internação acaba não reparando os danos cometidos e sim potencializando o ato infracional e estigmatizando o adolescente como criminoso.
Como propostas, as organizações e movimentos da sociedade civil que assinam o manifesto afirmam que garantir a implementação e aplicação corretas do ECA e do SINASE em todo o país, permitiria um primeiro passo para pensar em soluções à redução da violência e da criminalidade.